"Por Deus, tenham um blog!" Papa Bento XVI


Coragem, Levanta-te! Jesus te Chama!


sábado, 4 de fevereiro de 2012

Noticias de Angola


CONGREGAÇÃO DOS MISSIONÁRIOS DE NOSSA SENHORA DO SANTÍSSIMO SACRAMENTO Praça Bom Jesus, 38 | Centro | Manhumirim – MG | 36970-000 | [33] 3341 1900 | lenosdn@yahoo.com.br www.sacramentinos.org.br

CIRCULAR 004/2012

Fomos interrogados por alguns jovens da missão de São Bento sobre os procedimentos para se tornarem seminaristas da nossa Congregação. Achamos muito interessante esse questionamento, pois, faz apenas uma semana que chegamos a este país e a esta região. Falamos com Zacarias, Dino e Rui. Os dois primeiros se demonstraram mais interessados ao nosso convívio. Disseram-nos: "Gostamos da vossa congregação. Achamos bonito o modo como vocês chegaram a Kavungo, vocês demonstram muito amor as coisas de Deus". Falamos um pouco a eles sobre o nosso fundador – Pe Júlio Maria De Lombaerde, sua vida de amor e sacrifício ao Reino de Deus. Falamos sobre a nossa Congregação; carisma e missão. Sem muito aprofundamento, pois, eles não dão conta de compreender muita coisa em pouco tempo. O Rui procurava tirar algumas dúvidas entre inteligência e sabedoria. Em sintonia com os acontecimentos remotos, respondemos que a inteligência nasce com toda pessoa e a sabedoria cada pessoa tem que buscar e só a alcança por meio da oração, pois é uma graça divina. É pela sabedoria que vem de Deus que o homem age com benevolência e caridade com o outro, o entende e o acolhe como irmão.

Sentimos no coração que a nossa missão já vem acontecendo aqui desde a primeira visita dos nossos padres Geraldo Magela, Renato Dutra e Heleno Raimundo, para conhecimento do ambiente. Os corações estão muito abertos. Só de estarmos aqui, para viver e testemunhar a nossa vida de consagrados da vida religiosa e sacerdotal como Missionários Sacramentinos de Nossa Senhora, já chegamos ao coração das pessoas. Deus está à nossa frente. Nossa Senhora nos acompanha de uma maneira quase visível, senão visível mesmo em cada rosto; é impressionante! Na presença do Senhor no Sacrário renovamos a todo instante o nosso sim à causa do Reino.

Foi marcante a visita do senhor Augusto, catequista, de serviços, da nova paróquia de Santo Antônio de Kavungo. Hoje á tarde ele esteve conosco aqui na Missão de São Bento, percorreu os 54 km de bicicleta. Disse-nos que veio "resolver as coisas em Cazombo e queria ver os Padres". Conversamos um pouco mais sobre Kavungo e ele nos disse que todos os dias as pessoas perguntam pelos Padres. "Nós queremos vocês conosco, padres!" – afirmou ele. Ao mesmo tempo ele tinha conhecimento de que ficaríamos em Cazombo por duas semanas. Tocou-nos o coração este gesto de generosidade e amor aos padres. Situações como essas têm se repetido várias vezes com os jovens e as jovens que nos conheceram em Kavungo, por ocasião da missa de posse, e moram ao redor da missão de São Bento, todos os dias vêm estar conosco e nos chamam pelo nome. Deus nos chega ao coração de vários modos, precisamos estar atentos para percebê-Lo em nós.
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Foi emocionante para nós quando presidimos a primeira missa dominical junto às comunidades da Missão de São Bento, às 7h; e na Matriz de São Bento, às 9h, concelebrada pelo Pe. Lopes, Pároco da Paróquia de São Bento. Fizemos nossa primeira pregação em terras de além-mar. Deixamos a inspiração de Deus encher o nosso coração. Os nossos olhos contemplavam os olhares dos fiéis que estavam fitos em nós.

A liturgia foi providencial, pois a comunidade vivia momentos de tensão entre as tribos Luvale e Calunda. Pregamos sobre a misericórdia de Deus servindo-nos das leituras do livro de Jonas, Carta de São Paulo aos Coríntios e o evangelho de São Marcos, conforme a Liturgia do III Domingo do Tempo Comum. Introduzimos a pregação chamando a atenção para a situação de Jonas diante da proposta de Deus que o mandou aos ninivitas para anunciá-los a conversão. Jonas quis fugir da missão, porque ele pertencia a uma tribo que não era muito amiga dos ninivitas, mas ele não conseguiu fugir do chamado de Deus e a partir de sua pregação a vida dos ninivitas foi preservada e serviu de reflexão para Jonas que esperava a destruição da cidade conforme Deus o mandara pregar. Ele não entendeu a misericórdia de Deus. Convidamos a comunidade a refletir sobre esse relato e que se confrontasse com ele. Que sentissem seduzidos por esta Palavra. Tomando o texto da segunda leitura salientamos a importância de relativizar as coisas deste mundo por amor a Deus. Nossa vida terrena é passageira, não podemos viver desprezando as pessoas e muito menos as agredindo por não ser do nosso grupo. Deus amou-nos a todos sem distinção e o mesmo pede de nós. Busquemos as coisas de Deus, amor, compreensão, ternura, perdão, como nos orienta o apóstolo Paulo. A partir do evangelho pregamos sobre a maneira de Jesus falar. Ele fala com autoridade. Mas a autoridade de Jesus é reconhecida em suas ações. Toda a multidão percebia que o que Jesus falava tinha respaldo no seu modo de agir, na sua maneira de ser. Isto impressionava a todos. Jesus é o Mestre que escolhe seus seguidores; diferente dos mestres de seu tempo que esperava os interessados a seguir-lhes e efetuar a matrícula em suas escolas. Jesus escolheu quem ele quis para serem seus discípulos. Isto fez a diferença. Ao convite de Jesus todos deixaram tudo imediatamente e puseram-se a caminhar com Jesus como discípulos. Falamos também da conversão proposta por Jesus para acolher o Reino de Deus. A conversão é mudança de vida, de atitudes, de mentalidade. É um deixar radical de uma vida onde Deus não diz absolutamente nada. E se parece dizer é só mera aparência. Aceitar a conversão é entrar na própria verdade da pessoa. É não fugir de Deus. É reconhecer-se pecador, frágil, débil. É também a grandeza de tornar-se mais pessoa, mais próximo de Deus e dos outros. É reconhecer a força da graça de Deus. O convite à conversão é manifestação da misericórdia e bondade de Deus que quer fazer surgir no homem e na sociedade a força da esperança e da paz. Isto se torna possível quando se retiram as atitudes de pecado. Fizemos referência a uma das aparições de Fátima onde ela recorda-nos a força renovadora da conversão. "Só mudando a pessoa no seu interior se pode construir a cidade da paz".
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Rezamos muito nesta missa. Tudo nos falava do grande Mistério de Deus para nós. O silêncio de todos e a compenetração na ritualidade da liturgia. As leituras proclamadas em português e em Luvale, língua local. As músicas cantadas também nas duas línguas, as danças e o gingado do corpo. A presença do catequista que após nossa homilia a sintetizou e traduziu na língua local, a cultura oral é muito forte. Tudo isto nos falou com profundidade à nossa alma. Imaginamos o sentimento do nosso Fundador quando pisou pela primeira vez as terras africanas, como fazemos agora. O que deve ter passado ao seu coração. Temos certeza que ele se apaixonou mais ainda pela missão. Está explicado para nós porque ele interrompeu seu ritmo missionário na Europa e se prontificou a ser missionário no Brasil, na "Amazônia" brasileira. O seu coração estava cheio do amor de Deus pela causa dos menos favorecidos. Aqui, neste continente africano, o ardor missionário fala forte ao nosso coração. Estamos no berço da humanidade. Estamos aprendendo a não só estar, mas a ser missionário. Intercedemos a Nossa Senhora da Eucaristia a proteção diária. Vemos à nossa frente um povo feliz, sem conforto material; com muitas doenças, SIDA, Tifo, Paludismo, Verminoses e analfabetismo.

Com a graça de Deus vamos poder ajudá-los na erradicação do analfabetismo, sobretudo, através dos grupos de reflexão e dos encontros de formação, presença e estímulo para irem à escola. Estamos abertos ao amor de Deus. Desejamos que o Senhor nos dê sensibilidade para entender e aceitar a sua vontade. E que possamos realizá-la com amor e dedicação. Vemos o nosso Fundador lá no céu, ao lado da Trindade Santa sorrindo de alegria por ver nossa congregação doando de sua pobreza para testemunhar o amor, a misericórdia e a bondade de Deus junto ao povo em lugares onde o acesso hoje, ainda, é difícil.

O dia começa diferente, vamos passar o fim de semana em Kavungo, estamos animados... Logo de manhã nos foi apresentado um manual de orações em Luvale. No tempo da guerra muitos angolanos foram refugiados na Zâmbia e lá tiveram acesso a estudos e orações próprias da língua. Gostamos desta "novidade", apesar das instruções em inglês. A cada página uma surpresa. O livreto é do catequista João Francisco, já idoso, grande motivador das comunidades e da Legião de Maria. Ele vai nos explicando cada parte do livrinho e nos ajudando a pronunciar de maneira correta as palavras em Luvale...

Começamos os preparativos para a viagem. O que levar e o que deixar, uma vez que nosso objetivo é ficar até terça-feira em Kavungo. As Irmãs nos ajudaram com os mantimentos e ainda alguns presentes... Ficar longe de casa nos torna mais humildes para acolher a generosidade do outro.

Partimos logo após o almoço. Viagem de 54 km da missão São Bento até Kavungo, cerca de duas horas de viagem. Não pela distância, mas pelas condições das estradas, fomos cedo, pois o carro estava pesado. Levamos mais alguns itens de nossa mobília e havia o risco de ficar atolado na chana (área que fica alagada maior parte do ano. No período das
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chuvas a estrada que é um pouco elevada, vai afundando com o passar dos caminhões pesados que trazem mercadorias de Luanda, Lwena, Luau, Saurimo e outras regiões, havendo possibilidade dos carros pequenos ficarem atolados nos buracos que eles fazem...).

A viagem começa ótima, pois a empresa Conduril, de Portugal, está construindo uma ponte sobre o rio Zambeze. Ainda há só ponte metálica sobre o rio, e esta empresa está fazendo operação de "tapa buraco" na estrada. O rítmo é lento, mas é melhor que a surpresa em cada poça d’água... Só passamos aperto duas vezes, pois mesmo usando a tração do carro, foi preciso mais de uma tentativa para superar os buracos, a estrada ficou mais surpreendente pois havia chovido muito na região de Kavungo... Chegamos bem, por volta das 16h. Pe. Lopes voltou logo, pois atravessar a chana à noite é bem mais difícil.

É bom estarmos aqui1 Chegamos de surpresa, pois o povo nos esperava no domingo. Chegar sem esperar é virtude da Graça e sinal do Reino, não sabeis o dia e a hora, vigiai, pois a qualquer momento Ele pode chegar. Combinamos com algumas pessoas a missa no domingo às 8h.

Trouxemos algumas coisas de nossa bagagem e algumas caixas de móveis das que estão em Cazombo. As Irmãs da missão de São Bento têm sido verdadeiras irmãs. Presenteou-nos com cereais e muitas outras coisas, pra nossa estadia por uns dias...

Nossa casa nos aguardava, rezamos pedindo a Deus que nos ajudasse em nossa missão e que protegesse nossa casa de todo mal. A bênção é uma virtude dos que confiam na graça de Deus e se abrem a sua ação. No fim de um pequeno corredor colocamos um quadro de uma mulher africana, nossa primeira imagem ao entrar na casa. Nossa casa é pequena, tem uma varanda na frente de um metro de largura por 7m de cumprimento. Uma sala razoavelmente grande que se divide com cozinha, segue-se um corredor de acesso aos quartos; sendo dois à esquerda e um à direita antecedido por uma pequenina despensa e seguido do banheiro, aqui se chama casa de banho.

Ligamos o gerador de energia, pois já estava escuro, por volta das 18h. Começamos a organizar nosso lar, ligamos a arca, congelador, para conferir se estava funcionando, ótimo. Já teríamos água fresca e poderíamos armazenar alguma comida. Procuramos a vassoura que havíamos comprado em Lwena, mas não a encontramos. Improvisamos uma vassoura de sacolas e começamos a varrer a casa, muita poeira. Com um pouco de água que ainda restava na casa começamos a passar pano molhado, mas logo jogamos baldes de água em cada quarto e depois esfregamos tirando a poeira.
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Enquanto um limpava a casa, outro começava a ferver água, lavar as louças, panelas, talheres... O que temos pra sobreviver por aqui, não é muito, mas também não é nada de miséria, estamos bem servidos, bem mais conforto do que esperávamos, pois nos preparamos para menos... muito menos... Deus nos proveu de muito mais. Deus nos surpreende sempre. É como a repetição da travessia rumo à terra de libertação: Não faltou comida para o povo.

Com a casa mais limpa um pouco, começamos a preparar nossa janta, pois recebemos o aviso que o gerador seria desligado às 21h. Agilizamos para o jantar... Enquanto cozinhávamos procurávamos onde estavam as vasilhas, facas, ingredientes. Fizemos um quilo de macarrão, sim foi muito, mas comemos com gosto, bem temperado e quente, guardamos o que sobrou na arca para o mata bicho... [café da manhã].

Casa limpa, vasilhas lavadas e banho tomado, começamos a preparar o véu para nos proteger dos mosquitos; foi uma tarefa divertida... Colocar este acessório é muito importante, pois há muito paludismo (malária) nesta região. A casa já tinha novos moradores... É bom estar em casa... Já era quase 20h e estava chegando o momento de desligar o gerador, pois economizar gasóleo (óleo diesel) é muito importante por aqui por que temos que ir até Luau (200km) ou Lwena(500km) para comprar mais...

Lavar as panelas e talheres é uma tarefa artesanal, pia não tem encanamento, não chega água nem sai água, exercício de paciência muito grande, além de aproveitar o máximo uma bacia de água. Ainda estávamos lavando as vasilhas quando o gerador seria desligado, mas ainda deu tempo para arrumar as camas meio que no improviso, mas deu certo, assim voltamos à cozinha para terminar a louça. Terminamos a luz de lanterna...

A noite é muito escura em Kavungo, silenciosa também; boa para trabalhar, rezar, fazer planos para não ter planos... 23h... estamos abertos à graça de Deus. Olhando pro céu vem a sensação de estar longe de casa. É um sentimento estranho! Alegria por estar realizando um grande sonho, um projeto congregacional, pensado, refletido e rezado em muitas assembleias e Capítulos Gerais. Mas, pensando nas pessoas que estão do outro lado do Atlântico, nossa vontade é nos doar mais e mais. É um sentimento forte. Um apelo de Deus! Parece que quando a gente sai, a gente quer sair mais. É um mistério. Deus vai mexendo na profundeza da gente. É difícil de explicar. É coisa de Deus. Ele nos envolve. As pessoas são sempre pessoas em todo lugar. A diferença é o modo de ser pessoa e é aí que se encontra a razão da missão. Deixar Deus penetrar no modo da pessoa ser. Isto vai fazer a diferença na pessoa e na pessoa de todo mundo. Aqui estamos sendo mexidos pelo jeito de Deus se apresentar a nós em cada uma dessas pessoas que nos rodeiam, e são muitas. Conversamos bastante à luz da lanterna sobre os acontecimentos da semana e reafirmamos nosso desejo de ser boas testemunhas do evangelho de Jesus Cristo.
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Acordamos cedo dispostos a organizar nosso lar, ir ajeitando as coisas como donos da casa... Logo de manhã, às 6h, já chegam alguns jovens para nos acolher. A conversa fica animada, eles expressam muita alegria na fala, todos falam rindo com gestos de gratidão e reverência... "Sim, senhor padre!" É uma forma carinhosa de se dirigir aos padres. Precisamos fazer uma releitura da dimensão do poder nesta realidade. Há incutido nas pessoas um sentido de ordem e obediência à autoridade, talvez ainda seja reflexo dos anos de guerra. Ordem é para ser obedecida o que acaba gerando muita submissão e subjugação, pois quando estão longe da "autoridade" eles são mais "soltos" e alegres... Já olham a própria realidade com outros olhos, as palavras têm muito poder, portanto, devemos medir bem nossas palavras, se já tínhamos este cuidado, agora tomamos consciência que ele deve ser redobrado.

Após o mata-bicho [café da manhã] começamos a montar nossa mobília, móveis doados pela Diocese de Lwena, "Made in China", mas de bom gosto... Começamos montando o criado-mudo que aqui tem o nome de "viuvinha". Quando estávamos montando um quebra-cabeça para juntar as peças, chega o catequista Noel, responsável pelo setor Kavungo, esquema anteriormente de organização da Paróquia, que veio nos dar boas vindas e se colocar ao nosso dispor, caso necessário. Foi providente, pois havia algumas portas e janelas na casa com dificuldade de serem fechadas. Logo que ficou sabendo ele foi procurar um "mestre" para estes consertos.

A chegada do mestre Tomás também foi providente porque nós só tínhamos duas chaves de fenda como ferramentas, assim ele foi fazendo o serviço dele e nos emprestando suas ferramentas. Com o passar do tempo foram chegando outras pessoas, pois a notícia se espalhou na comuna – "Os nossos padres estão aqui". Cada um que chegava ficava olhando, procurando um jeitinho de se colocar a serviço. Conversando sobre a Missa que aconteceria no domingo e arrumando a "mala de missa" que recebemos da Diocese, constatamos que havíamos esquecido as partículas para consagração na missa. Novamente o catequista Noel foi procurar alguém que pudesse ir até a missão São Bento para trazer estas partículas. Assim, aproveitaríamos para encomendar também mais gasóleo para colocar no gerador, pois só havia o suficiente para 5 horas de trabalho. Chega o nosso mensageiro e transportador. Iria de motorizada, 62 km de estradas bem esburacadas. Combinamos o custo da viagem, 2000 kanzas (quanzas), e ele partiu. Continuamos a montar nossos móveis e mais pessoas foram chegando, outros catequistas, coroinhas, representante da juventude, responsável pelos cânticos... e outros.

Quando estávamos já terminando de montar a primeira "viuvinha", chega um caminhão do exército cheio de pessoas que estavam indo para Zâmbia. O comandante do grupo veio nos trazer as partículas. Pe. Lopes havia percebido também que tínhamos deixado as partículas sobre a mesa da sala de sua casa. Muitas pessoas vão para Zâmbia a procura de recursos médicos. O militar, Costa Antônio, mostrou-se também muito
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solícito e falou de sua viagem e quando voltaria ao Cazombo. Conversamos um pouco e aquele caminhão partiu cheio de pessoas para muitas horas de viagem.

Voltamos a "vaca morna" dos móveis. O mestre Tomás terminou seu serviço de consertar janelas, portas e fechaduras e ficou ali na sala olhando o nosso movimento. Não demorou e ele também começou a nos ajudar. O serviço foi ganhando alegria e descontração e da conversa animada. Eles nos ensinando algumas palavras em Luvale e dando risadas de nossa pronúncia e nos corrigindo. De pedacinho em pedacinho de aglomerado chinês os móveis foram surgindo. Até quando vão durar? É um grande mistério...

Começamos montar outro projeto, o do armário, verdadeiro quebra-cabeça, mas devagar fomos decifrando o desenho e montando as peças... Já eram 12h30, pausa pra tomar um pouco de sumo (suco de frutas) e biscoitos... Partilha gera compromisso, todos bebemos e conversamos. Continuamos no trabalho. A fome também tem presa. E aquele um quilo de macarrão, da noite de sexta, que guardamos na arca (freezer), foi pela Providência, Deus é grande... Esquentamos o macarrão, colocamos sobre a mesa, uma pequena oração e a panela de macarrão ficou sobre a mesa para todos... Espontaneamente um jovem começou a servir a todos, o que era muito em um dia, no outro se torna pouco; sim, aconteceu a multiplicação. O jovem que servia a todos ficou por último, quando começou a comer chega mais um ajudante na casa e, pra nossa alegria, este jovem passa seu prato para o que chegou por último. Ninguém tem tão pouco que não possa partilhar o que tem, este gesto marca um novo paradigma de como devemos falar de Eucaristia com estas pessoas. Já existem os frutos da Eucaristia, o que nos desafia é dar um sentido mistagógico para estes gestos de partilha. Eucaristizar o mundo do jeito de Maria. À noite, na partilha de como vivemos este dia, conversamos muito sobre este gesto e como ele nos tocou e nos fez rezar... Os gestos falam mais do que as palavras.

Depois deste "almoço" que muitos comeram em pé mesmo, continuamos na montagem do dito armário. Foi um grande quebra-cabeça descobrir onde estavam e quais seriam as dobradiças das partes deste armário. Todos olhando o desenho que acompanha as peças e a conversa estava animada, até que encontramos as peças e o trabalho rendeu, muitas mãos... pega ali, segura aqui, levanta lá, aperta parafuso, bate martelo... quando ficou pronto o bendito armário, a alegria foi grande... Eles têm uma forma muito interessante de demostrar a alegria, dizem algo como: "Graças a Deus, muito obrigado"... e batem palmas.

Voltando à montagem dos móveis, tivemos uma surpresa: as caixas que abríamos faltavam os parafusos, assim o trabalho teve que ser encerrado para tristeza do grupo, pois todos estavam se divertindo.
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Assim começa outra etapa interessante, a preparação das leituras da missa do domingo. Um conversa outro escuta, alguém já tinha visto o lecionário dominical sobre a mesa e já encontrado as leituras, já havia marcado, mas é necessário saber bem quais são as leituras de cada domingo, pois é diferente do Missal no Brasil, que tem os anos A, B e C bem divididos. Aqui as leituras aparecem juntas. No quarto domingo do Tempo Comum, tem as leituras dos três ciclos, em ordem... A preocupação era o Salmo, precisavam do Missal para ensaiar a melodia do Salmo. Assim, os que eram responsáveis pela liturgia foram pra Igreja realizar o ensaio e em pouco tempo podíamos ouvir os cânticos, as várias vozes irrompendo a tarde de Kavungo. Eles cantam muito alto e a comuna (como uma cidade no Brasil) é pequena, acho que todos escutam.

Ainda ficaram dois catequistas na casa, Noel e Augusto, conversando sobre a comunidade, as outras regiões de Lóvua e Caianda, as dificuldades de acesso. A conversa rendeu, mas a vida continua e eles sentados na sala. O tempo aqui é cronometrado de maneira diferente, nós estávamos arrumando a casa, varrendo, lavando vasilhas e, claro, colocando o feijão para cozinhar, panela de pressão foi item prioritário no enxoval. Nossas visitas ainda na casa, nos olhando, enquanto fazíamos estes ofícios da casa e conversávamos com eles. Não faz parte da cultura deles homem trabalhar em casa, ainda mais as "autoridades". Terminamos de lavar as vasilhas, passar o pano molhado na casa e eles lá, nos olhando e conversando. Os gestos falam mais que as palavras, o que estes gestos estão falando ainda não sabemos, só com o tempo, mas não queremos passar ideia de que estamos aqui para ser servidos.

Chega à tarde e hora do banho frio. Aproveitar a água que vem do reservatório. A estação de geração de energia alimenta também a bomba que enche o reservatório. Quando precisamos de água abre-se o mesmo, não pode ficar todo tempo aberto pois os encanamentos não estão em perfeitas condições de uso, mas dá pra tomar banho de chuveiro e encher os reservatórios de água sem muito esforço, um verdadeiro luxo, pois o povo fica o dia todo com bidões (galões) de água na cabeça.

Enquanto o gerador estava ligado aproveitamos para carregar os computadores, máquinas fotográficas e celulares, que aqui estão servindo de lanterna e são muito úteis, e fazer o jantar, cardápio: arroz, sopa instantânea e claro, aquele feijão com bastante alho e fervendo... é bommmmmm.

A missão nos torna mais irmãos, em nossas partilhas podemos sentir com o coração do outro. Conversamos bastante sobre a luz fraquinha da lanterna, mas tem nos ajudado muito, lembramos o tempo em que vivíamos na zona rural e não tínhamos energia também. Fazer dos desafios um motivo de alegria e dar risadas, nos torna mais humildes também. Fomos dormir já pensando e rezando pela primeira missa em nossa Paróquia.
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Com grande alegria presidimos nossa primeira missa na nova paróquia de Santo Antônio de Kavungo. Só nós dois no altar, sem auxílio dos anfitriões. Somos os anfitriões. Pároco e Vigário, Missionários Sacramentinos de Nossa Senhora e o povo de Deus, sorrindo e nos tratando com muita estima. Foi uma missa bonita com duas horas e trinta minutos de duração. Sem pressa. É dia do Senhor. Leituras em Luvale. Cânticos em Luvale e em português. Pregação mais pausada que a do domingo anterior: vivendo e aprendendo. O povo está vibrando com a presença de nossa Congregação junto deles. Claro que tudo é começo, mas a sinceridade é vista de imediato. Já citamos algumas palavras em Luvale e isto nos aproximou mais ainda deles. Ficam felizes quando ouve de nossa boca alguma palavra em Luvale. Em nossa pregação pontuamos a importância da escuta da Palavra de Deus; a importância da virgindade consagrada ao senhor e a força do mal que se cala diante da força de Deus. Palavra de Deus que atinge o nosso coração causando uma mudança de comportamento em nós. Como a cultura oral aqui é forte, chamamos a atenção para ouvirem bem a Palavra de Deus. Ele é a luz para o nosso caminho. Foi interessante que na hora dos avisos o catequista geral, senhor Noé, já queria saber dos padres quando vai ter reunião com todos os catequistas e quando vamos começar as visitas as comunidades mais próximas da sede, pois as mais distantes não têm estrada nessa época chuvosa. Marcamos a reunião com os catequistas para o próximo domingo após a missa. Quanto a visita às comunidades temos que esperar surgir uma condução, isto porque as comunidades mais próximas, ficam a mais de 20km da sede. Percebemos nessa cobrança que a comunidade também se preparou para receber a nossa Congregação desde a primeira visita dos padres em novembro de 2010. O filho nasceu, agora, tem de se movimentar. Na missão, quando só o missionário se prepara para o envio, ao chegar deve ter paciência, paciência e paciência, ir se adaptando à nova realidade. Quando a comunidade que vai recebê-lo, também se prepara, quando os dois se encontram é um verdadeiro parto, Natal! O entrosamento se dá num tempo bem menor que o anterior. A comunidade já espera uma aproximação mais rápida e ações mais contínuas. Não é um estranho que chegou é alguém deles mesmos que chegou para melhorar a vivência da fé e da escuta da Palavra de Deus. Foi uma experiência marcante o que vivemos da provocação do catequista.

Após a missa todos foram convidados para uma foto oficial. O que alegrou e reuniu a todos debaixo da mangueira ao lado da Igreja Matriz. Onde também anunciamos que em nossa bagagem veio uma bola, bateram palmas e marcaram o futebol para às 15h. No campo foi outra grande alegria ao nosso coração. Às 15h chegaram uns 4 jovens à nossa casa nos convidando para irmos ao campo. Pegamos a bola, que foi presente da pelada de quarta-feira às 16h30, no UBA, em Manhuaçu-MG, Brasil. Dirigimo-nos para o campo acompanhado por um grande número de jovens e crianças. Nas casas ao redor, todos nos olhavam
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com um bom sorriso no rosto. Primeiro brincaram as crianças, em seguida os jovens e adultos que se dividiram em dois times. Brincamos até quase 18h. Nós estávamos juntos jogando bola e tirando fotos. Ao final da partida, juntamos todos no meio do campo para uma palavra de incentivo e no momento rezamos o Pai Nosso em português e em Luvale, o que alegrou a todos. Já em casa partilhamos da beleza que Deus nos ofereceu neste domingo junto da comunidade.

Após a celebração da missa a Irmã Suzana nos perguntou se poderíamos conduzir (dirigir) até a Vila Cazombo para levar algumas Meninas do Internato para a abertura oficial do ano letivo. Prontificamo-nos e cumprimos a tarefa com alegria. Foi, sem dúvida, mais um passo nas pegadas do nosso Fundador que demonstrou muito amor à educação por onde passava. Estacionamos a caminhoneta, desceram as meninas do internato, que se dirigiram de imediato para onde estavam postos os alunos, ali mesmo no pátio da escola, ainda em reforma. Seguimos para as cadeiras reservadas às autoridades. Nos discursos fomos lembrados como autoridades religiosas colaboradoras do desenvolvimento da educação no país.

Esta presença é marca da nossa missão. Através do contato com os alunos a espiritualidade vai se firmando nos corações da juventude.